Insatisfação Crônica

Resolvi tirar alguns dias pra recarregar as baterias. Fui para o Resort Pousada do Rio Quente, balneário aqui próximo de Brasília, com suas piscinas de águas quentes e correntes. Um paraíso!

Lá revi alguns amigos; fiz novos, e nos divertimos muito. Um desses novos amigos me contou que tinha acabado de ler um livro muito interessante escrito por um tal Maquiavelho, filósofo e historiador que viveu no século XV lá pra bandas do velho mundo. Vou resumir o resumo que ele fez do livro que conta a história de Emejota, músico que encantou, desde cedo, reis e rainhas, súditos, ricos e pobres por toda a Europa e também fora dela.

Emejota nascera pobre, porém possuía um dom para música e tornou-se cantor famoso. Começou ainda menino, cantando com os irmãos. Tendo-se destacado, resolveu fazer carreira solo, o que provocou um rompimento com os pais e os irmãos.

Emejota , rapaz dedicado, explodiu com sucessos após sucessos, tornando-se ídolo de muitos em todo o mundo. Suas músicas, românticas, dançantes. Seu jeito de dançar, diferente, inovador, provocante, gostoso, empolgou jovens de todas as idades.

Emejota ficou rico, riquíssimo. Como teve uma infância muito pobre, sem recursos, resolveu dar pra si próprio um grande presente: um enorme castelo, com mais de mil metros quadrados, muitas salas e muitos quartos. Tudo finamente decorado e acabamento com pedras e metais preciosos. E mais: o castelo fora edificado em um enorme terreno de muitos acres, que de tão grande era considerado uma pequena fazenda, sítio ou rancho.

Era a glória! Uma vida realmente de um astro. Merecida, pois afinal Emejota era o Rei de muitos súditos nos quatro cantos do mundo. Trabalhara muito, duro. Treinos; horas intermináveis de ensaios, estudos e planejamento para agradar a todos e fazer sucesso a qualquer preço. É verdade que havia muita gente por trás desse estrondoso e meteórico sucesso: Produtores, editores, empresários, bailarinos, e uma gama de outros profissionais que se faziam necessários na realização dos mega-shows realizados.

Contudo, Emejota não estava feliz. Havia uma ou mais coisas que lhe incomodava. Possuía muito dinheiro e era ídolo de muitos. Conseguia tudo que quisesse. Era só estar os dedos e, como um passe de mágica, seu desejo era realizado. Tinha a pele escura, nariz chato e os cabelos encaracolados. E isso o encomodava. Não gostava da cor de sua pela e nem do formato do nariz. Ao que parece o moço sofria de Insatisfação Crônica, uma das piores e mais catastrófica doença do ser humano.

Então, Emejota procurou grandes médicos da época para dar solução aos seus problemas estéticos. Alquimistas foram contratados para formular um remédio que fizesse sua pele mudar de cor. Finalmente, após anos de tratamentos e ingestão daquelas porções mágicas, a cor de sua pele mudou para branca como o leite. Seu nariz foi alterado várias vezes até ficar muito afilado; Afilado demais. Na verdade ficou meio esquisito. Sabe, não ficou legal; era, visivelmente, artificial.

Bem, agora estava tudo bem: fortuna, castelo, pele branca e nariz afilado. Ah, sim, os cabelos também mudaram para ondulados. Sua fama, cada dia maior. Estava em todos os tablóides da época; era notícia recorrente. A sua transformação foi objeto de muita discussão e debates. Seus páreas originais, os negros, na maioria não gostaram. Consideraram que Emejota havia traído a raça. Como pode mudar a cor da pele, tão bonita! E o nariz, como pode mudar a marca registrada da raça!

Os anos passaram e Emejota na mídia e com sucesso e mais sucesso. Moço, homem feito, descobriu que na verdade ainda mantinha viva a criança que um dia fora. Para satisfazer esse lado, mandou construir em seu rancho um grande parque de diversão. Queria se divertir como criança, coisa que não fizera quando o fora. Para isso, abriu os portões do castelo para várias crianças que passavam horas e até mesmo dias se divertindo com Ele no parque.

Bem, como quem faz sucesso desperta inveja em muitos, seus inimigos viram a oportunidade de difamá-lo. Acusaram-no de haver cometido um crime chamado pedofilia. Fora taxado de pedófilo. Cruzes, que nomes mais esquisitos. Mas, do que se tratava? Simples, Emejota havia feitos brincadeiras com algumas crianças que foram entendidas ou interpretadas como libidinosas! O que, o moço abusou sexualmente de criancinhas?

Pronto, agora Emejota aparecia em todos os tablóides como o pedófilo do ano. Como pode! Que escândalo. Ídolo internacional, inacreditável! Urgentemente, como não poderia deixar de ser, foram contratados os melhores e mais caros advogados da época para defendê-lo. Os processos acabaram em acordos que, somados aos custos com os advogados, lhe custaram uma fortuna. Seu patrimônio começara a ser dilapidado.

Nos bastidores, intensos trabalhos foram realizados para apagar essa imagem terrível. Resolveram que Emejota deveria se tornar pai. Então, de repente aparece em público com bebes dizendo que eram seus, uns adotados, outros tidos com uma senhora contratada como barriga de aluguel e inseminada como sêmen seus. Também, aparentemente seguindo orientação de seus empresários, desaparece da mídia. Em certas ocasiões a melhor estratégia é fazer-se ausente e o tempo se encarregará de apagar as lembranças ruins.

Ao que parece, os problemas de Emejota nunca acabaram. Na verdade, aumentaram. Começou a tomar remédios de todos os tipos na tentativa de curar seus males, físicos e mentais. Sua fortuna, cada dia menor. Seus gastos e suas excentricidades cada dia maiores. De ricaço, se viu, de repente, devedor. E seus credores querendo receber.

Contudo, Emejota continuava a ser o ídolo que sempre fora. Aquela imagem de pedófilo já havia sumido. Seus fãs queriam vê-lo novamente. Sentiam sua falta. Afinal, o ser humano não saber viver sem pelo menos um ídolo para conduzi-lo. Já chegara o momento de reaparecer. Dar a volta por cima. Recuperar sua fortuna. Pagar seus credores. Física e mentalmente ainda doente, despreparado e desmotivado, aceitou voltar, porém devagar, como poucas apresentações; afinal, já não era tão jovens mais assim.

Aí a coisa pegou. Seus credores queriam receber. Seus empresários sabiam que ele ainda era uma mina de dinheiro. E estava ficando velho, doente, neurótico e esquecido. Não podiam mais esperar. Era preciso estruturar um plano que permitisse aproveitar o potencial dessa mina de ouro. Conclusão e decisão: Emejota valia mais morto do que vivo. Um plano perfeito. Seria levantada uma fortuna. A sua morte era a solução para todos, inclusive para ele próprio. Afinal, suas angustias cessariam.

Então começaram os trabalhos, metódicos, sistemáticos e ardilosamente engendrados para matar Emejota e arrecadar milhões. Um dos esquemas foi marcar em um reino distante, rico e com pessoa que eram fieis aos seus ídolos, mesmos os que já se foram, vários shows e com ingressos caros; vendidos antecipadamente.

O plano era o seguinte: Emejota morreria antes da realização dos shows. Seus fãs, consternados, não irão querer o dinheiro de volta. Guardariam os ingressos como recordação.

Como planejado, certa manhã o reino e logo, em seguida, o mundo recebeu a notícia da morte repentina e misteriosa de Emejota. Perfeito; estava funcionando! O mundo inteiro, atordoado, chorava e comentava a morte de mais um de seus ídolos. Como pode, nosso rei morreu?! Como viveremos sem Ele?!

A partir de então, como era previsto, tudo, mas tudo que era ou lembrava Emejota foram vendidos, a peso de ouro. Foi um deus-nos-acudam! Re-edições de tudo. Correrias: esse é meu! Sai pra lá, eu peguei primeiro! Nossa, como é caro! Não importa, acabou.

Sejamos justos; Foi um super-plano. Coisa de profissional. Mistério! Muitas, muitas informações contraditórias. Erro médico; Remédio errado. Mas como, aparentemente, Emejota estava bem! Testamentos; filhos; família; ex-mulheres, amigos, fãs chorando, todo mundo tonto! Esse era o objetivo: comprem, comprem tudo, nos queremos é a grana de vocês.

E, finalmente, Emejota estava em paz!!

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